Os Amantes Passageiros é a mais nova comédia de Almodóvar e marca sua volta a atmosferas mais descontraídas depois do tenso A Pele que Habito. Já de antemão, vale dizer que Os Amantes Passageiros é uma proposta “relax”, um filme que não quer ocupar a mente de quem assiste com grandes questionamentos e não quer compromisso com o que é verossímil. Saia de casa com isso em mente, a não ser que você queira bancar o bobo, como fez uma senhor sentada à minha frente, na sessão. Ao rolarem os créditos finais, ela soltou um “que horror”.
Pois bem. Os Amantes Passageiros se passa quase que totalmente a bordo de um avião, mais especificamente na classe executiva, que corre o risco de cair porque um dos trens de pouso apresenta problema. Só abrindo um parêntese: esse problema é culpa dos personagens de Penélope Cruz e Antonio Banderas, que dão o ar da graça só para fazer graça. E para dar mais credibilidade (ou público mesmo) ao filme. Eles abrem o longa e não passam mais que 5 minutos na tela. Mas o elenco é repleto de atores que acompanham Almodóvar há tempos. Você os reconhecerá. O foco do filme se divide nos vários passageiros e também na tripulação – comissários, piloto e co-piloto. As histórias de todos são exploradas das mais variadas formas, confissões, conversas ao telefone que são ouvidas por todo mundo no alto falante, fofocas.
Bem escrachada, por sinal. Esqueça o peso e a tensão de Fale com Ela, por exemplo. Almodóvar não está nem aí e aproveita de sua fama e reputação para falar do que bem entende, da forma como lhe convém, que é a forma mais característica que ele encontrou. Ninguém faria esse mesmo filme da forma como ele fez. Tem de tudo: socialite prostituta, sensitiva virgem, piloto bissexual, piloto em cima do muro, traficante, comissários gays afetadíssimos, matador de aluguel, gente usando drogas, homem cafajeste… E todos esses personagens se relacionam por meio de situações as mais improváveis. O apelo sexual é bem forte e grande parte das piadas (que são ótimas) vem justamente dessa abordagem. E, sim, Os Amantes Passageiros é um filme predominantemente gay. Isso não quer dizer que seja um filme para gays, até mesmo porque isso não existe. Arte é arte, não tem essa de restringir. Lembre-se: não faça como a senhora que pejorativamente disse “que horror”. Se alguém ainda não sabe, Almodóvar é gay. E esse fato deixa o filme bem natural no sentido de atuações, diálogos, expressões específicas, comportamento e afins. Para quem ainda não viu: a cena em que mostra o comissário de bordo pela primeira vez na cabine dos pilotos é impagável, de longe minha favorita.
Inscreva-se para receber nossas notícias e novidades em seu e-mail e cancele quando quiser.
Algumas críticas por aí dizem que, além disso tudo que a hora e meia de filme mostra, Os Amantes Passageiros também faz uma crítica à atual situação da Espanha, comprometida financeira e economicamente etc e tal. Sinceramente? Não importa. Assim como não importa o dramalhão que, ainda bem, recebeu tratamento secundário o tempo todo. O que importa é o clima caliente, de novela mexicana, escrachado e que mostra que ninguém ali se preocupa com o que vai acontecer com o avião. Afinal de contas, melhor mesmo é beber, fofocar, dançar, transar, aproveitar. Hedonismo, acima de tudo. Para Almodóvar, para os personagens, para quem assiste.