Eu me lembro claramente de uma época onde era comum termos como “humor negro”, “sátira” e “sarcasmo” algumas das desculpas para legitimar comportamentos machistas, racistas e homofóbicos. Mas graças a Deus a sociedade evolui, o que não parece ter acontecido ainda com o pessoal da hamburgueria Underdog. Isso porque nos últimos dias a hamburgueria realizou um post nas redes sociais com uma esquete fictícia, onde uma funcionária aparecia apanhando por ter feito um prato que um cliente não gostou.
A repercussão do vídeo foi instantânea. Diversas pessoas que têm um pingo de humanidade e respeito em relação à causa da violência contra as mulheres acharam que era uma piada de péssimo gosto e começaram a denunciar o vídeo, que logo foi deletado pelo próprio Instagram por violar as regras da rede. Além disso a página foi inundada de comentários furiosos de todos os tipos por conta da publicação.
A hamburgueira Underdog então decidiu tomar algumas atitudes, como suspender os comentários das publicações mais recentes e postar algo que passa longe de uma atitude digna de gerenciamento de crise. O criador da ideia do vídeo postou no feed um vídeo que ele intitulou como “Direito de resposta”, onde ele não demonstra qualquer arrependimento, mas tenta confrontar e reduzir as críticas a movimentos de blogueiras e youtubers.
Vale lembrar que esta não é a primeira vez que a hamburgueria se envolve em polêmicas. Como bem lembrou a matéria publicada no site da Marie Claire, em 2017 o público se demonstrou descontente com o comportamento dos donos de exibirem uma frase solicitando aos clientes que amarrassem as crianças ao poste.
Mas não é preciso ir muito longe para encontrar mais coisas problemáticas. No próprio Instagram da Underdog ainda é possível encontrar um vídeo onde eles mordem um sanduíche e entregam para o cliente em nome da “piada”. O mais engraçado é que eles, em nenhum momento, estão em posições desfavoráveis. No vídeo da mordida, um dos responsáveis pelo estabelecimento é quem dá a mordida, mas quem vai até a mesa dos clientes passar vergonha é a atendente. Mais uma vez, uma mulher.
Consultada pela Marie Claire, a advogada especialista em direito digital e cofundadora da Rede Feminista de Juristas Isabela Guimarães, diz que legalmente, seria passível de uma atuação no Ministério Público. “Nesse caso se identificaria que houve uma violação de direitos coletivos e se tentaria um processamento por essa área. O que não é comum, mas já aconteceu. Eu vejo muitos problemas nessa questão porque ela tem cara de produção de conteúdo publicitário, afinal de contas estamos falando de um empreendimento, um restaurante. Não é uma produção de arte autônoma. Está conectado com finalidades comerciais e lucrativas. O que faz o fato de se utilizar de uma situação delituosa, em uma publicidade, parecer bastante abusivo, descontextualizado das responsabilidades que a produção publicitária no Brasil se impõe a si mesma”.
Nos dias atuais fica bastante complicado discutir estes assuntos, porque tudo acaba entrando no âmbito político e uma parcela da população que se recusa a rever seus próprios hábitos e convicções sempre arruma uma desculpa para justificar atitudes injustificáveis, como este vídeo. Mas São Paulo tem uma infinidade de hamburguerias, não custa nada escolher quem tem feito trabalhos legais e respeita as pessoas, as mulheres, as crianças e as críticas.